Decisão do TJ obrigando pagamento dos salários cortados

 

TJBA – DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO – Nº 485 - Disponibilização: Quinta-feira, 26 de maio de 2011 Cad 1 / Página 146

DECISÃO

Trata-se de Mandado de Segurança com pedido liminar inaudita altera pars, impetrado por ADUSB - Associação dos Docentes da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia contra ato imputado ao Secretário de Administração do Estado da Bahia e do Reitor da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, ora apontado como autoridade coatora, que teria competência para dar cumprimento integral à pretensão no sentido de obter o pagamento dos salários dos professores referentes ao mês de Abril/ 2011 e a abstenção de suspensão dos pagamentos de salários durante o período da greve.

Acerca dos fatos, narra a Impetrante que "na UESB os cortes de verbas têm inviabilizado não apenas as atividades de ensino, pesquisa e extensão, mas até mesmo a manutenção de despesas básicas, tais como pagamento de energia, telefones, correios, segurança e limpeza". Acrescenta que o Governo do Estado editou o Decreto n.º 12.583/11 que, "dentre outras obrigações, reduz em 30% os recursos destinados à Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia", "proíbe a contratação de professores substitutos, a realização de concursos públicos para cargos de provimento efetivo e a concessão de licença para cursar mestrado e doutorado".

Sustenta que "em razão das manifestas ilegalidades do Decreto n. 12.583/2011 e da postura do Governo do Estado em não aceitar negociar a revogação deste instrumento normativo, a Adusb em Assembléia realizada no dia 05 de Abril de 2011, em conformidade com seu Estatuto e Regimento deliberou que […] os docentes da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia deflagrariam um movimento de greve por tempo indeterminado a partir do dia 08 de Abril de 2011, sendo assegurada a manutenção dos serviços essenciais em funcionamento".

Afirma que, "com fulcro no parágrafo único do art. 3º da Lei 7.783/89, notificou-se, naquela oportunidade, o Poder Público com 48h de antecedência da deflagração do movimento grevista e, ato contínuo, apresentou-se a pauta de reivindicação do movimento".

Acrescenta que "o comando de greve assegurou a permanência de 30% do serviço público em funcionamento, determinando que não seriam paralisadas as atividades: a) da Reitoria; b) das Pró-Reitorias; c) dos Departamentos; d) dos Colegiados; e) Dos Órgãos de Assessoria da Universidade; f) das Atividades de Pesquisa; g) das Atividades de Extensão; h) das Atividades de Pós-Graduação; i) dos Laboratórios; j) do Núcleo de Prática Jurídica"; além de um "Comitê de Ética que pudesse analisar todos os pedidos de restabelecimentos de atividades de ensino, pesquisa ou extensão durante o período de greve".

Nesse contexto, a impetrante alega que foram obedecidas todas as normas previstas nas Leis 7.701/1998 e 7.783/1989, regulamentadoras dos Direitos e Deveres dos Servidores Públicos Civis, cuja incidência sobre o Direito de Greve foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. Argumenta que "apesar de restar plenamente caracterizada a legalidade do movimento grevista, o Governo do Estado da Bahia não realizou o pagamento dos salários do mês de Abril aos professores", além de não ter adimplido "sequer os 8 (oito) dias de trabalho que foram regularmente prestados pelos professores da UESB no mês de abril".

Noutra senda, sustenta que o direito ao recebimento de salários é espécie de direito fundamental que deve ser assegurado inclusive no período de greve. Ademais, aponta que o "empregador não pode se utilizar de meios que possam constranger o empregado a voltar a trabalhar".

Ao final, por entender presente a verossimilhança das alegações, bem assim o requisito do periculum in mora, requer a concessão da medida liminar, inaudita altera pars, para que se determine à autoridade coatora que promova o pagamento dos salários dos professores referentes ao mês de Abril/2011 e se abstenha de suspender os pagamentos de salários durante o período da greve. Do Colegiado requer a confirmação da liminar e integral concessão da segurança.

Regularmente distribuídos, vieram os autos à minha relatoria.

É o relatório.

À vista do pedido antecipatório, na forma do que dispõe o Regimento Interno desta Corte, passo a proferir decisão monocrática.

Nesse desiderato, em se tratando de mandado de segurança, deve-se perquirir se estão presentes os requisitos do artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, de maneira apta a justificar a concessão da medida precária.

De plano, para efeito de concessão da liminar, se demonstram relevantes os fundamentos apresentados, tendo em vista que, sob análise perfunctória, revela-se presente nos autos comprovação de que a ADUSB observou as regras previstas na Legislação aplicável ao exercício do Direito de Greve.

Quanto ao tema, considerando a necessidade de observância e respeito ao Direito Constitucional de Greve, à vista da falta de regulamentação específica, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por meio do Julgamento do Mandado de Injunção 708/DF, sob Relatoria do Ministro Gilmar Mendes, que deveriam ser aplicadas as Leis 7.701/1988 e 7.783/1989 para regular a matéria enquanto o Poder Legislativo não editasse a lei específica pertinente.

Nesse plano, de acordo com o artigo 6º, §§ 1º e 2º, da Lei 7.783/89, observa-se que a negativa de pagamento dos salários aos professores não pode ser medida utilizada como meio de constranger o movimento grevista a findar-se. Tal medida, entretanto, poderia ser adotada pelo Poder Público quando verificada a abusividade do movimento, o que não se revela latente no presente caso, de modo que, sob análise precária, materializa-se legítima a pretensão liminar da Impetrante conforme requerido na exordial.

Nesse sentido, diante dos argumentos fáticos e legais expostos pela Impetrante, se mostra razoável o atendimento do pedido em caráter liminar, pois apresenta relevante fundamento nos autos e pode ensejar situação de irreversibilidade caso a segurança não seja concedida ao final.

Sobre o tema é importante observar a lição de Cássio Scarpinella Bueno:

É comum a lição de que o fundamento relevante que autoriza a concessão de medida liminar em mandado de segurança é mais intenso do que o mero fumus boni iuris, que autoriza a concessão de liminar em ação cautelar (CPC, art. 804), e, mesmo, que a prova inequívoca da verossimilhança da alegação de que trata o art. 273 do Código de Processo Civil, quando regula a antecipação de tutela. [...]

Daí que, para fins de mandado de segurança, são necessários o exame e aferição da alta probabilidade de ganho da causa pelo impetrante a partir das alegações e do conjunto probatório já trazido com a inicial. [...] Nesse sentido, não há como negar que TJBA – fundamento relevante é elemento que exige prova mais intensa - porque circunscrito à documentação e às alegações que acompanham a inicial - que aquela suficiente para outras formas (técnicas) que autorizam a prestação jurisdicional da tutela de urgência (cautelar e antecipação de tutela). (Mandado de Segurança: Comentários às Leis n. 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 - 4ª ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva, 2008, pgs. 91 e 92)

Também se verifica presente o requisito do periculum in mora, chamado na ação mandamental de "risco de ineficácia da medida". O artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, determina que a liminar em mandado de segurança seja deferida se, além do relevante fundamento, existir o risco de tornar-se inócua a impetração em função da possibilidade de perecimento do direito antes da decisão definitiva. Nesse sentido aponta Cássio Scarpinella Bueno:

[...]

Por periculum in mora ou ineficácia da medida deve-se entender a necessidade da prestação da tutela de urgência antes da concessão final da ordem, sob pena de comprometimento do resultado útil do mandado de segurança.

[...]

Dito de outro modo: toda vez que o dano que o mandado de segurança quer evitar - para assegurar o exercício pleno do direito do impetrante - tender a ser consumado antes do julgamento da ação, o caso é de ineficácia da medida e, desde que presente o outro elemento do inciso II do art. 7º em análise, legítima a concessão da liminar. (Mandado de Segurança: Comentários às Leis n. 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66 - 4ª ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva, 2008, pgs. 92 e 93)

No caso em análise, revela-se presente o risco da demora no provimento jurisdicional. Isso porque, confirmada a ausência de pagamento de salários aos professores por parte do Estado da Bahia e constatado o caráter induvidosamente alimentar de tais prestações, configura-se cediço que o aguardo do transcurso normal deste processo afetará as  condições de sobrevivência dos professores.

Diante de tudo quanto exposto, considerando presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora no pedido da ação mandamental, CONCEDO A LIMINAR pleiteada para determinar às Autoridades Coatoras que procedam imediatamente

ao pagamento dos salários do mês de Abril aos professores universitários da UESB e, verificada a manutenção dos serviços básicos com a continuidade do trabalho de 30% (trinta por cento) do efetivo funcional, que se abstenham de proceder à suspensão do pagamento destes salários durante o período de greve, até julgamento definitivo do presente mandamus.

Oficie-se às Autoridades Coatoras para que apresentem as informações que entenderem necessárias, no decêndio legal.

Notifique-se o Estado da Bahia, na pessoa do Procurador Geral do Estado, para intervir no feito caso tenha interesse.

Cite-se a Procuradoria Jurídica da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia para responder os termos da presente ação.

Salvador, 23 de Maio de 2011.

Desª DAISY LAGO RIBEIRO COELHO

Relatora