Nota técnica do DIEESE sobre medidas emergenciais para o Sistema Financeiro

Propostas de medidas emergenciais a serem adotadas pelo Sistema Financeiro Nacional em razão da crise do coronavírus (Covid 19)

As instituições governamentais, o Congresso Nacional, as Centrais Sindicais, o Banco Central, entre outros organismos, vêm elaborando medidas emergenciais para conter os impactos sanitários e econômicos do coronavírus. Embora em um cenário de incertezas quanto à amplitude dos eventos, constrói-se algum consenso acerca da necessidade da adoção de ações preventivas para conter o alastramento da pandemia, bem como da criação de instrumentos que possam mitigar seus efeitos sobre o consumo e a renda da população brasileira.

Nesse contexto, agentes do setor financeiro implementaram algumas medidas voltadas a esse período de crise, que visam facilitar a concessão de novos créditos e a renegociação de créditos já concedidos, além de ampliar a liquidez do sistema financeiro para suprir a demanda do mercado.

No entanto, essas iniciativas ainda são insuficientes, já que não alcançam parte da população excluída da proteção formal ao emprego, como trabalhadores uberizados e informais, além de empregados em micro, pequenas e médias empresas do setor de comércio e serviços, pequenos produtores rurais e agricultores familiares. Também não há previsão de medidas que garantam emprego e que reduzam, de fato, o endividamento das pessoas, como, por exemplo, a postergação do pagamento de financiamentos e de contas enquanto perdurar a crise.

Nota-se, ainda, que não há adesão do conjunto das instituições financeiras para a aplicação das medidas até então adotadas, cuja eficácia depende, imprescindivelmente, do engajamento de todas as entidades bancárias - públicas ou privadas - já que seria necessária a utilização das estruturas físicas e, sobretudo, digitais desenvolvidas pelo sistema bancário brasileiro, de modo a oferecer maior capilaridade e melhor distribuição dos serviços no território nacional.

Nesta Nota Técnica, apresentam-se algumas sugestões de propostas que podem colaborar para que o sistema financeiro atue de forma mais incisiva na contenção dos impactos da pandemia sobre a economia. É importante considerar que essas propostas foram formuladas entre 18 e 20 de março e, em virtude da excepcionalidade da situação, serão constantemente atualizadas.

Proposta 1 - Suspensão temporária da cobrança de, pelo menos, três prestações mensais de empréstimos, seja via aplicativo do banco (APP) ou internet banking, sem necessidade de comparecimento às agências

O risco mais imediato oriundo da paralisia econômica decorrente do coronavírus é a suspensão dos fluxos de renda das famílias e empresas e a consequente impossibilidade de honrar compromissos financeiros imediatos, como pagamentos de contas, impostos, prestações de empréstimos.

É fundamental, portanto, garantir a pausa por, ao menos, 90 dias na cobrança das parcelas de empréstimos bancários já contratados nas seguintes linhas:

• Pessoa Física (PF):

Crédito Habitacional

Crédito para aquisição de veículos o Crédito Pessoal não consignado

Crédito Consignado

Essas operações representam 67% do saldo de crédito de PF no Brasil.

• Pessoa Jurídica (PJ):

Capital de Giro

Crédito Imobiliário

Crédito Rural

Crédito com recursos do BNDES

Essas operações representam 61% do saldo de crédito de PJ no Brasil.

• Não poderão ser cobrados juros ou tarifas adicionais referentes ao período de duração da pausa no pagamento das parcelas de empréstimos;

• Após esse período, as parcelas (principal + juros) voltarão a ser cobradas normalmente;

Propostas de medidas emergenciais a serem adotadas pelo Sistema Financeiro Nacional em razão da crise do coronavírus (Covid 19)

• O período de suspensão do pagamento das parcelas do crédito poderá ser ampliado mediante avaliação do estágio da pandemia no Brasil;

• A solicitação de suspensão no pagamento das parcelas será realizada, prioritariamente, por meios digitais, como aplicativo para smartphone ou internet banking.

Proposta 2 – Criação de linhas de crédito com taxas de juros reduzidas e carência de seis meses para pagamento desses empréstimos, com garantia de emprego

O regime de quarentena a que parte da população está submetida e a proibição de aglomerações, reduz abruptamente o fluxo de pessoas nas ruas e, consequentemente, o movimento em bares, restaurantes, lojas, cinemas, teatros, shows, entre outros, paralisando o faturamento das empresas do setor de comércio e serviços, de pequenas, médias e micro empresas e de trabalhadores informais.

Para garantir a travessia desse momento turbulento e viabilizar que essas empresas e pessoas mantenham os pagamentos dos seus compromissos com trabalhadores, fornecedores e governos, os bancos devem oferecer linhas de crédito especiais, com carência de seis meses para o início do pagamento das parcelas e taxas de juros anuais no valor máximo da taxa Selic (3,75% a.a).

Nos casos de migração do crédito de dívidas anteriormente contratadas no mesmo banco para as novas linhas, além da redução das taxas de juros, deve-se assegurar um período de pausa de 90 dias no pagamento das parcelas, como previsto na Proposta 1.

A contratação de financiamento ou migração de dívida anterior poderá ser realizada por canal on-line (mobile ou internet banking) e via autoatendimento (ATMs) e deverá ser isenta de cobrança de tarifas.

Essa linha deverá ser disponibilizada a todas as pessoas, independentemente de sua adimplência ou não em operações já contratadas anteriormente.

No caso de concessão de crédito para empresas, a disponibilização dos recursos e os benefícios aqui mencionados deverão estar condicionados à manutenção do emprego.

Proposta 3 - Isenção de tarifas para transferências eletrônicas

As operações de Transferências/DOC/TED devem ser isentas da cobrança de tarifas bancárias quando realizadas em canais eletrônicos nos próximos 90 dias - ou pelo período em que permanecer a pandemia. Essa medida visa reduzir o fluxo de pessoas às agências bancárias e, como efeito secundário, ainda garantirá uma folga adicional no orçamento das famílias.

Proposta 4 - Portabilidade do crédito entre bancos diferentes

Os bancos deverão facilitar a portabilidade do crédito dos clientes que queiram transferir suas dívidas anteriormente contratadas para linhas de crédito especiais com taxas de juros mais reduzidas oferecidas por outros bancos durante o período emergencial.

Para tanto, os clientes poderão:

• Transferir dívidas de cartões de crédito, cheque especial, financiamento de veículos, financiamentos imobiliários, crédito pessoal e consignado;

• O banco que fez o empréstimo não poderá criar dificuldades para a portabilidade e terá 15 dias para informar o saldo da dívida ao cliente e ao novo banco;

• O novo banco só poderá recusar a portabilidade mediante justificativa por escrito e no prazo de cinco dias após o recebimento das informações sobre o saldo do banco anterior;

• O novo banco não poderá cobrar tarifa pela portabilidade, bem como pela venda de novos serviços;

• O banco antigo não poderá retirar do cliente produtos nem benefícios em função da transferência do empréstimo.

Propostas 5 - Disponibilização de cartões de débito virtuais, sem tarifa adicional.

As instituições financeiras deverão disponibilizar cartões de débito virtuais, sem cobrança de tarifa, a todos os clientes.

Propostas 6 - Utilização de estruturas de bancos públicos e privados para o repasse

de recursos e benefícios sociais

Os governos (federal/estadual/municipal) poderão se utilizar das estruturas físicas e virtuais de bancos públicos e privados para que recursos/benefícios disponibilizados pelo poder público para o enfrentamento do coronavírus alcancem o beneficiário final - correntistas ou não correntistas do banco - de forma rápida e segura.

Propostas 7 - Incentivo à agricultura familiar e garantia da segurança alimentar

• Prorrogação do vencimento dos financiamentos da agricultura familiar:

Custeio – prorrogação para 31/12/2020

Investimento - prorrogação para seis (6) meses após o vencimento;

• Antecipação do crédito de instalação para assentados(as) da reforma agrária (Incra);

• Liberação do Pronaf A para assentados(as) da reforma agrária (Incra) e beneficiários(as) do Terra Brasil - Programa Nacional de Crédito Fundiário;

• Criação de linha de crédito emergencial para agricultores(as) familiares, com teto de até R$ 30 mil, prazo para pagamento de 10 anos e taxa de juros subsidiada, para recuperação e manutenção das atividades produtivas da propriedade;

• Criação de linha especial para manutenção das propriedades da agricultura familiar que tenham Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) e renda familiar de até 03 salários mínimos mensais e que não se enquadrem em nenhum tipo de renegociação. O valor da linha será de um salário mínimo mensal por um período de 03 meses, podendo ser prorrogado, como forma de subsistência da família.

Proposta 8 - Disponibilização de serviços online e chat, para orientar consumidores e clientes

Os bancos deverão disponibilizar acesso mais amplo a serviços online e chat para orientar consumidores/clientes no serviço de renegociação de dívidas, aquisição de linhas de crédito especiais, entre outros, de modo a facilitar o acesso às informações e evitar a ida de pessoas às agências, especialmente os mais idosos.

Veja o documento em pdf.

Via DIEESE